sexta-feira, 19 de março de 2010
Já gastámos as palavras...
Adeus
Eugénio de Andrade
Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mão à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes!
e eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
no tempo em que o teu corpo era um aquário,
no tempo em que os meus olhos
eram peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...,
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.
Adeus.
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Lindo o seu blog. Lindos os trabalhos.Muito interessante.
ResponderEliminarParabéns.
ACABEI POSTANDO A MINHA PARTICIPAÇÃO. MESMO NÃO TENDO CONSEGUIDO. MAS, COMO TENHO A CERTEZA QUE NÃO FOI MINHA CULPA, RESOLVI ACEITA O DESAFIO E POSTAR ASSIM, MESMO. AGORA VOU TE ESPERAR PARA CONFEIR.
CARINHOSAMENTE NESTE ENDEREÇO
http://sandrarandrade7.blogspot.com/2010/03/nosso-auto-retrato.html
VOU TE ESPERAR LÁ, AMIGA.
SANDRA
Uma linda poesia de grande sensibilidade.
ResponderEliminarParabéns..
Sandra
Eugénio num dos seus melhores momentos.
ResponderEliminarPena não saber o autor da imagem...
Para ser perfeita, deveria ser da Foz do Douro...
Um beijo, MARGARIDA.
Olá, João:
ResponderEliminarO autor da foto sou eu e é das traseiras da minha casa em Lisboa... já que não tinha outra mais condizente... Foi o que se arranjou!!!
Sandra, esta poesia é de um dos nossos maiores poetas. E eu adoro-a...
Beijos, Sandra e João.
gosto muito da poesia de Eugénio de Andrade, mas ao contrário do que diz o poeta eu penso que as palavras nunca se gastam.
ResponderEliminarEsta poesia é de uma enorme contundência. Tem beleza,desencanto e crueldade.
ResponderEliminarEu acho que não há nada mais brutal de dizer a uma pessoa:
"Dentro de ti
não há nada que me peça água."
Susana
As palavras gastam-se os argumentos também, mas a verdade é que também sou daquelas pessoas, que acho que vale a pena lutar por compreender. Há sempre outra margem e se o leito se desconcerta, tem que se rasgar um novo trilho. Para que as coisas fluam e a água escorra.
É preciso beber e matar a sede.
...e assim, minha querida MAR-IA das Mercês, as palavras floresceram nas tuas mãos, porque lhes deste novo sentido.
ResponderEliminar...mas as palavras que o Eugénio quis dizer das suas palavras, foram tão magoadas que se esfiaparam e deslaçaram...morreram de cansaço, morreram gastas...
Venha mais uma rodada de palavras!!! Vamos pô-las em festa, minha gente!!! Que vivam as palavras!!!